Abstract
Este artigo visa refletir sobre a moral contemporânea a partir da ética de Nietzsche, tendo como foco principal a sua _Genealogia da Moral_ e, como contraponto a ser problematizado, o livro _The weariness of the self_ do sociólogo francês Alain Ehrenberg. De início, para analisar alguns tipos morais relevantes na primeira obra, revisamos o itinerário genealógico entre a “vontade de verdade” cristã e o niilismo budista (ou “ceticismo em matéria de moral”), destacando ainda alguns comentários de Nietzsche em torno de Kant e o utilitarismo inglês. A autocrítica kantiana do conhecimento, afinal, manteve intacta a valoração negativa (cristã) da vida ao não questionar o valor em si da verdade. Por sua vez, ao arrogar o bem definitivo à felicidade, o utilitarismo inglês tornou a compaixão cristã compatível com o “ceticismo em matéria de moral”. A partir disso, argumentamos que a nova figura moralmente exemplar — não sendo mais a do cristão, alvo principal da genealogia nietzschiana — é a do budista, uma vez que este adere integralmente o niilismo. Em um segundo momento deste estudo, problematizamos a tese de Ehrenberg segundo a qual a figura do “indivíduo soberano” teria hoje se tornado hegemônica sob a égide da categoria da depressão. Não sendo concebível, sob o prisma nietzschiano, tal “indivíduo soberano” deprimido descrito por Ehrenberg, observamos, por fim, que é o niilismo que efetivamente se prolifera hoje: a partir da ilusão de superação total da moralidade, a moral contemporânea cultiva a fraqueza e o cansaço fisiológico através de um programa de combate irrestrito ao sofrimento.