Abstract

Na perspectiva da economia, a questão do dom é de tal modo marginal que nos poderíamos mesmo interrogar sobre até que ponto poderá valer a pena proceder a uma articulação teórica da mesma com questões como a do mercado, a da justiça social ou a do reconhecimento. Neste sentido, o artigo começa por clarificar o conceito de dom, o qual, por ser demasiado genérico, carece de efectividade. Nessa linha, dos três tipos de dom identificados, o autor usa apenas a noção de dom associada com as trocas rituais típicas das sociedades tradicionais, ou seja, aquele tipo de dom que tinha já sido teorizado em termos sociológicos por Marcel Mauss, em 1924. O artigo procede depois a uma análise crítica do modo como o conceito de dom tem sido utilizado por dois eminentes economistas contemporâneos, George Akerlof e Colin Camerer. Com efeito, e prosseguindo na esteira de Marcel Mauss, o autor do artigo desenvolve urna nova hipótese em relação ao dorn cerimonial, insistindo sobretudo no facto de que as suas práticas podem ser reconhecidas como consistentes apenas na medida em que nelas podermos identi-ficar procedimentos públicos de reconhecimento recíproco entre grupos humanos. Assim, no seguimento desta nova compreensão, do fenómeno da doação, o autor explica de que modo este procedimento tem sido transposto para o interior das sociedades modernas e de que modo a procura ou a luta pelo reconhecimento se transformou num dos aspectos mais essenciais da justiça social. Este facto, naturalmente, não deve ser entendido de forma estática no ámbito de uma redistribuiçâo de bens ou no sentido de um mero conjunto de direitos; pelo contrário, segundo o autor do artigo, esta é uma situação que exige uma interpretação positiva, a qual passará necessariamente por uma abordagem como a de Amartya Sen, ou seja, uma em que a exigência de reconhecimento é entendida de forma estruturalmente dinâmica a partir da noção de capacidade dos agentes. As seen from an economic point of view, the question of the gift is so marginal that we may wonder how it could be worthwhile to articulate it with those of the market, social justice and recognition. Accordingly, the author tries in the first place to clarify the concept of gift, which is too general to be effective. Out of three types of gift that can be identified, the only one used in this article by the author is the gift involved in the ritual exchanges of traditional societies. The specific nature of this type of gift has already been sociologically theorized in 1924 by Marcel Mauss. Moreover, the article also analyzes how two prominent contemporary economists (George Akerlof and Colin Camerer) have used this concept in an interesting but somewhat questionable way. Therefore, the aim of the author is, in the wake of Mauss' analyses and beyond them, to present another hypothesis concerning ceremonial gift-giving, the practices of which can only seem to be consistent if they are understood as a public procedure of reciprocal recognition between human groups. Hence, building on this new foundation, the article tries to explain how this procedure has been transposed within modern societies and how the demand or struggle for recognition has become for us a central aspect of social justice. This cannot be reduced to a static view involving the redistribution of goods or to claims to a new set of rights; it must be understood in a positive way - following in particular Amartya Sen's approach - as a dynamic offer regarding the capabilities of agents