"Como tornar-se o que se é": Si-mesmidade e fatalismo em Nietzsche

Dissertatio 33:189-226 (2011)
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Abstract

“Como tornar-se o que se é” é a máxima que Nietzsche resgata da II Ode Pítica, de Píndaro, para fazer frente ao “conhece-te a ti mesmo”. “Conhece-te a ti mesmo” é a “receita para o declínio” enquanto “como tornar-se o que se é” exprime a “conservação de si”. O estabelecimento dessa oposição requer, todavia, alguns esclarecimentos. Antes de tudo, não podemos ignorar que Nietzsche recorre à tradução latina nosce te ipsum para o grego gnothi seauton, uma opção engenhosa, sobretudo se levarmos em consideração as disputas interpretativas na antiguidade em torno do sentido do “conhece-te a ti mesmo”. Originariamente, a máxima délfica era equivalente à sophrosyne, cumprindo, assim, a função de recomendar prudência ao homem na sua vida prática. Ulteriormente, no entanto, o “conhece-te a ti mesmo” foi assimilado como um apelo para que o homem conhecesse o seu divino nous. Essa interpretação, predominante nos períodos helenístico e imperial, foi introduzida pela tradição platônica, sendo em seguida combinada, por Fílo, com elementos da tradição hebraica, culminando com a idéia de que o conhecimento de si só pode ser alcançado pela conversão rumo a Deus. Essa digressão nos revela, portanto, que quando Nietzsche emprega o nosce te ipsum, ele busca interrogar justamente esse sentido tardio, manifestamente metafísico, atribuído ao “conhece-te a ti mesmo”. A máxima délfica surge como um problema na medida em que faz do homem um animal assombrado pela sua carência de ser. A ilusão de querer atingir um “ideal de ser humano”, “ideal de felicidade”, “ideal de moralidade”, a fé de ser depositada no futuro ou no passado, engendra a negatividade no homem e o impede de ser si mesmo. Assim, a máxima “como tornar-se o que se é” busca indicar que é somente mediante uma maneira fatalista de encarar a vida, isto é, que prescinde do saber de si e do querer-se diferente, que cada um pode conservar a sua si-mesmidade e ser completo.

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