Abstract
A teoria da evidência faz-nos pensar o conhecimento a partir da sua face mais obscura, ainda que, paradoxalmente, a estranheza surja aqui do lado da luz: arquétipo cognitivo, diz-nos Fernando Gil, a luz é universalmente “a matéria natural do verdadeiro”. As condições perceptivas de produção da evidência apelam inevitavelmente para a visão e suas metáforas; os sentimentos de satisfação que o sujeito experimenta perante a descoberta da verdade são a consequência de um desejo em direcção ao verdadeiro, que eclode como um brilho, uma iluminação, até mesmo uma vibração. Temos na evidência uma presença misteriosa, a partir do olhar giliano; ela exprime-se pelo conceito freudiano de unheimlich – a “inquietante estranheza”. Trata-se de um dos factores de eficácia da própria evidência, já que esta liga o sujeito ao mundo externo, de maneira apodíctica e plena, para além de que é típica das situações em que o real e o irreal se confundem, segundo Freud: esta “estranheza familiar”, como também se pode dizer, abre caminho a um excesso cognitivo no vislumbre certeiro de um possível real e verdadeiro.