Impensable, indispensable

Revista Filosófica de Coimbra 32 (64):359-382 (2023)
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Abstract

Tão fecunda quanto paradoxal, a noção de clássico implica uma referência de excelência que só é reconhecida retrospectivamente, uma inserção histórica tanto quanto um valor intemporal, a autoridade de uma tradição bem como a liberdade criadora de uma apropriação actual, o elitismo da recepção aliado à popularidade do acesso. Após uma sinopse etimológica e lexicográfica, este artigo explora a noção de “clássico” na hermenêutica de Paul Ricœur. De facto, é todo o espectro da teoria da interpretação, mas também da tradução e da leitura, que pode ser mobilizado para tratar desta noção, ambivalente na própria utilização que dela faz o autor de Temps et Récit. A hermenêutica começa a ser a “arte de compreender os clássicos” no sentido lato do termo: textos sagrados e profanos na encruzilhada de horizontes geográficos e históricos. Explicação e compreensão, crítica e pertença, afastamento e desdistanciamento, são tantas dicotomias metodológicas através das quais se desenvolve a ideia do carácter plural e activo da recepção dos clássicos. Tanto quanto a sua teoria, é também a prática ricoeuriana que evidencia a sua concepção dos “clássicos”. Paul Ricœur é um leitor-pensador que mediatiza as tensões tanto quanto articula as oposições entre os autores canónicos a partir dos quais elabora o seu próprio pensamento. Estes são alguns dos desafios da impensabilidade e da indispensabilidade dos "clássicos" e da própria noção de "clássico".

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