Abstract
Pouco antes de falecer, Jorge Luís Borges determinou que sua esposa, Maria Kodama, não publicasse seus livros regionalistas de juventude em suas obras completas, que assim ficariam incompletas, uma decisão tipicamente borgiana. A viúva preferiu não cumprir a determinação e as obras editadas se tornaram completas, na medida em que possam ser descobertos manuscritos ainda inéditos. Elas revelam um amplo arco, correspondendo à sua longa vida, da juventude muito argentina e profundamente bonaerense, do seu país e cidade natal Buenos Aires, ao mundo. Os seus artigos, publicados mais em revistas literárias que jornais, desde cedo revelam esta vocação universal. Jorge Luís Borges escreveu com freqüência sobre autores estrangeiros. Depois, os próprios temas dos livros vão mudando dos regionalismos e até localismos, rumo às dúvidas e ambigüidades intrinsecamente humanas de todas as partes do mundo, onde ele as imaginariamente situa. Ao fim e ao cabo, Jorge Luís Borges – traduzido e homenageado em muitos países – preferiu morrer em Genebra e lá ser sepultado, onde estudara na adolescência, quando fora muito feliz na descoberta inicial de outras culturas. Elas demoraram a nele predominarem, mas terminaram acontecendo. Mesmo assim, ele no íntimo nunca deixou de todo a argentinidade. Crescentemente cosmopolita, o nacionalismo jamais abandonou por completo o espírito de Jorge Luís Borges. Sua atitude pró-britânica, durante a própria Guerra das Malvinas, pode ser interpretada como protesto e advertência diante de uma derrota próxima.